“Vulnerabilidade não é ganhar nem perder;
é ter a coragem de se expor, mesmo sem poder controlar o resultado.” (Brené Brown)
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Recentemente, logo após voltar a participar de treinos de natação, perguntei ao meu pai: “Por que eu parei de nadar quando era criança?”.
Ele me respondeu: “Você lembra quais eram as regras, filha?”.
“Lembro, claro: praticar qualquer esporte sem a obrigação de competir.”, eu respondi.
“Exatamente. E você preferiu dançar a nadar.”, explicou meu pai.
Essa foi uma das poucas exigências que meu pai fez ao longo da minha infância: praticar uma modalidade esportiva. Apesar da expectativa de que eu seguisse seus passos - ou suas braçadas - e me tornasse uma nadadora, meu pai sempre deixou claro que eu podia praticar qualquer esporte e me incentivou em todas as escolhas que fiz de lá pra cá, assim como minha mãe. Por isso, depois que aprendi a nadar, deixei para trás a piscina e passei a dançar.
Além disso, eu podia competir, mas não era obrigada a fazê-lo. E foi provavelmente graças a essa autonomia que não construí uma carreira como ginasta: aos dez anos de idade, já praticava Ginástica Rítmica Desportiva (GRD) há três anos. Foi então que o clube que eu frequentava comunicou que eu não poderia continuar a fazer parte da equipe infanto-juvenil de GRD se não competisse. Naquela época, não queria competir, porque com frequência esquecia partes das coreografias enquanto estava me apresentando (provavelmente pelo nervosismo), o que me constrangia diante de grandes plateias. Além disso, os treinos já duravam seis horas, ocupando todas as minhas tardes, de segundas às sextas. Lembro de um desabafo que fiz à minha mãe: “Enquanto meu irmão joga tênis e futebol, brinca no parquinho e nada na piscina com você, eu fico trancada no ginásio!”. Por essas e outras, deixei de praticar GRD e passei a dançar Jazz, o que fiz durante cerca de dez anos, junto ao Hip Hop e ao sapateado.
A partir do momento em que me tornei adulta, o esporte deixou de ser uma obrigação imposta por meu pai e se tornou uma decisão minha, porque àquela altura eu já compreendia o valor do movimento do meu corpo para a minha saúde física. Foi muito tempo depois que percebi o valor ainda maior que tem esse movimento para minha saúde mental: autoconhecimento, resiliência, introspecção, tolerância à frustração, concentração, coragem, paciência... Muitas das características que tomo como qualidades eu construí por meio da prática de esportes.
Atualmente, a natação, o ciclismo e a musculação fazem parte da minha rotina como práticas de autocuidado, assim como o café da manhã nutritivo, a leitura e a meditação. Para mim, estar comprometida com a saúde de outras pessoas demanda, em primeiro lugar, estar comprometida com a minha - e essa é uma das maneiras que encontrei de honrar meus privilégios.
E não é que, na idade adulta, voltei a nadar? Após algumas lesões frustrantes causadas pela corrida de rua, buscando um esporte em que meu corpo não sofresse com impacto, voltei a bater pernas e dar braçadas. Então, quando ainda morava em Fortaleza, comecei a participar de treinos de natação no mar e de pequenos campeonatos em águas abertas, o que continuei a fazer quando me mudei para Belo Horizonte e, mais tarde, para Florianópolis. Mas aqui, na Ilha da Magia, não consegui nadar no mar durante o inverno: depois de dois treinos com os lábios roxos, no mês de junho, decidi fazer uma pausa, que acabou durando um ano. Em junho deste ano, voltei a nadar, mas dessa vez em uma piscina aquecida e coberta.
Em agosto, pouco tempo depois de voltar a nadar, descobri que no final de setembro haveria um pequeno campeonato de natação em um clube da cidade. Já tinha competido algumas vezes em águas abertas, mas nunca em piscina - nunca tinha experimentado a largada de mergulho com salto, inclusive. Além disso, não conhecia o universo da natação em Floripa. Por isso, perguntei a mim mesma se “passaria vergonha” no campeonato. Mesmo assim, fiz minha inscrição e, depois de pensar algumas vezes em desistir, fui ao campeonato, porque para mim mais importante do que a oportunidade de competir era a oportunidade de fazer algo pela primeira vez, de conhecer pessoas e de me divertir!
Lá, tive uma surpresa bonita: as últimas pessoas a completarem as provas não sentiam vergonha por serem as mais lentas ali; ao contrário, elas eram recebidas com palmas por quem estava do lado de fora da piscina, prestigiando as(os) atletas, porque eram tomadas como exemplos de coragem e determinação. Quanto a mim? Além de me divertir um monte e aprender a largar com salto e mergulho, descobri que com uma boa dose de adrenalina posso nadar muito mais rápido do que imaginava: em uma das provas, fiquei em primeiro lugar na minha categoria! Mas a melhor parte foi conhecer uma turma incrível, pessoas que participaram do campeonato para representar a mesma academia que eu. E não é que passei a treinar com elas depois do campeonato? Tem sido uma experiência maravilhosa!
Voltei para casa naquele dia, após o campeonato de natação, muito reflexiva: quantas experiências perdemos por medo de sentir vergonha? De quantos afetos nos priva nossa covardia? De quais oportunidades abrimos mão para esconder nossa vulnerabilidade? O que negamos a nós mesmas para não furar a idealização do outro a nosso respeito? O que perdemos por falta de humildade? Quanta vida desperdiçamos a cada vez que não nos permitimos fazer algo por puro prazer, curiosidade ou diversão?
Como nos diz Brené Brown,
“Vulnerabilidade não é ganhar nem perder; é ter a coragem de se expor, mesmo sem poder controlar o resultado.”
Vulneráveis somos todas. O que desejo para mim e para você é, portanto, coragem!
Com respeito e afetos,
Larissa.